A interdisciplinaridade é um traço do movimento relacional que inaugurou vários diálogos com saberes afins, que sejam das ciências psicológicas e da mente, de um lado, ou das outras áreas de saber, do outro lado, como na psicologia do desenvolvimento, as ciências cognitivas, a biologia, a filosofia, a sociologia, a ecologia, as ciências políticas, etc.

A época onde as escolas de psicanálise ficavam isoladas na sua “soberba indiferença”, em redor de um mestre incontestado passou. Estamos orientando-nos além dos vários “ismos” que a história da psicanálise desenvolveu: freudismo, kleinismo, lacanismo, bionismo, etc.

O movimento relacional se caracteriza com a ausência de qualquer mestre a pensar, figura emblemática que promulgaria alguma escritura santa que não pode ser criticada, sob pena de anátema ou excomunhão. Estamos, pelo contrário, num espaço de redes múltiplas onde a circulação está aprimorada.

Os vários autores ditos relacionais produzem teorias próprias que não impedem trocas e debates fecundos para a elaboração da psicanálise a vir.

Neste contexto, vários eixos podem ser destacados:

  1. Uma psicologia de duas pessoas

A abordagem relacional considera que o processo deve ser pensado em termos de duas pessoas, presentes na sessão. As noções de transferência/contratransferência são subvertidas em favor de considerações de campo ou de sistema, segundo os autores, e os diversos acontecimentos durante a sessão são resultados das interações cocriadas entre os participantes.

A posição clássica do cirurgião, do espelho ou da tela branca não é mais considerada como a atitude sine qua non para que haja análise ou psicoterapia. Que ela queira ou não, o analista está envolvido no processo e não poderá controlar as encenações (enactments) que acontecerão necessariamente.

Neste contexto, é o foco sobre o processo, a cada momento, e os padrões de organização das próprias sessões, que fornece a bússola de orientação no tratamento.

As posições são mútuas, embora assimétricas, entre analista e paciente, de tal maneira que os pontos emergentes desse andamento possam acontecer.

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  1. Os estudos sobre cuidadores e infantes:

Desde os anos setenta, a área da psicologia do desenvolvimento viu uma verdadeira revolução acontecer, nos estudos sobre as relações entre cuidadores e infantes.

Seguindo a intuição de pioneiros como Winnicott e Bowlby, segundo os quais não existe um infante sem cuidador, os estudos inaugurados por Meltzoff, Trevarthen e D.N. Stern vão mudar a paisagem da psicanálise sobre essas questões do desenvolvimento.

Os psicanalistas vão entrar no laboratório e estudar o que está acontecendo nas trocas entre cuidadores e infantes, além da área até então privilegiada da amamentação. As dimensões do olhar e da voz vão permitir descobertas revolucionárias sobre a visão clássica, errada, do recém-nascido como simbiótico ou passivo.

As noções de ruptura e reparo, junto com a nova teoria do apego, fornecem bases robustas para pensar o desenvolvimento, de um lado, e o contexto das sessões terapêuticas, do outro lado.

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  1. As neurociências

Desde a década do cérebro (1995 – 2005), os avanços das neurociências foram tão grandes que muitos analistas relacionais trabalham com algumas hipóteses oriundas desses achados.

De uma maneira surpreendente, os avanços das neurociências tiveram como consequências uma aproximação cada vez maior com a psicanálise, entrando num diálogo fecundo, longe de qualquer reducionismo de uma para outra.

Que sejam com as noções de implícito/explícito, de memória procedural/declarativa, neurônios espelhos, plasticidade cerebral, influências recíprocas do meio ambiente e do cérebro, regulação das emoções, mindfulness, neurobiologia interpessoal, as trocas ficam muito ricas e abrem novas possibilidades.

Algumas hipóteses clássicas podem ser confirmadas ou não, num novo campo de estudos particularmente fecundo. A psicoterapia muda nosso cérebro.

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  1. Os estudos sobre gêneros

Desde Freud, a teoria do complexo de Édipo, o complexo de castração e os conceitos oriundos dos primeiros estudos de sexologia do século XIX, muitas coisas aconteceram na área das relações entre os seres humanos. A noção de gênero veio para ficar e os movimentos feministas na psicanálise, em suas diversas ondas, repensaram as questões sobre o devir sexuado do ser humano.

A partir da origem da noção de gênero, como foi primeiro conceitualizada nos anos 60, muitas reflexões foram produzidas para entender estas noções de sexo, de gênero, de identidade de gênero.

Várias analistas, no movimento relacional, desenvolveram um pensamento de desconstrução dessas noções, a partir dos estudos de gêneros, sociais e políticos, no âmbito de uma psicanálise revitalizada pelas colocações do construcionismo social, na pós-modernidade.

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  1. Novas hipóteses teóricas

Esses achados clínicos começaram a ser pensados dentro de novas hipóteses teóricas, ligadas à ciências contemporânea.

Vários autores começaram a estudar as noções de sistemas dinâmicos não lineares, complexidade, teoria do caos, fractais, para poder encontrar novos meios de pensar uma psicanálise contemporânea, construindo em cima de uma clínica que não é mais aquela de uma Vienna do império austro-húngaro em deliquescência, ou de Londres sob as bombas da segunda guerra mundial, ou de Nova York sob o Macarthismo, ou ainda de Paris em redor dos eventos de maio de 68.

Os deslocamentos sobre as noções de processo, de dissociação, de sistemas motivacionais ou de estados múltiplos do self, implicam novas maneiras de teorizar e pensar a psicanálise, além dos modelos hidráulicos ou comunicacionais tradicionais.

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